Monday 10 January 2005

Surfada ao Luar

Esta história tem uns 5 ou 6 anos, mais coisa menos coisa. Passou-se durante uma das clássicas viagens ao Minho em Agosto, após a época de exames. Muita coisa mudou, mas a onda continua lá e a amizade também!

Sábado à tarde, primeiro fim-de-semana de Agosto. La Ola foi particularmente generosa connosco. Depois de descer desde Posa com algumas brincadeiras pelo meio, chegamos a Arbo, olhamos para o meio do rio e Voila!! a onda deve estar no ponto!!! É que só dentro de um determinado nível a onda se apresenta surfável e estava mesmo no extremo superior, segundo nos pareceu. Enganamos a fome com umas sandes, esticamos as pernas e lá vamos. O caudal ainda está alto, a onda, surfável e rápida, baixa e sem espuma no topo. No caminho até lá ainda apanhamos uns remoinhos jeitosos, bons para brincar mas que parecem chatinhos de para nadar!!

Resto da tarde: surfar sem parar. Ensaiar uns 360 de fazer inveja a todos os presentes (o Miguel, com o XXX do Zé Tó), um bocado de back-surf, outras manobras absolutamente fantásticas sem nome e irrepetíveis!! E o mais cansativo: tentar convencer os principiantes a ir lá: “Não custa nada!!”, “Vais ver, depois não queres outra coisa”, “Confia em nós!!” Os sorrisos de orelha a orelha denunciavam que tínhamos razão!
Quando estamos para vir embora, aparecem o Vasco e o Lipinho, vindos de Melgaço, onde foram ao supermercado. Lá temos de ficar mais um bocado a fazer-lhes companhia...
Resultado: saímos da água com os braços a pesar que nem chumbo, as pernas retorcidas, mas a cabeça leve. Umas Super Bocks na relva e os braços ficam mais leves. Benditos Vasco e Lipinho, que foram às compras e já sabem como estas coisas funcionam!!!

É agora que vem o motivo da história. O Miguel fala com uns espanhóis que lhe dizem que vão descer o rio desde Cequelinos, esta noite, com a ajuda da lua cheia. Duas e meia no parque de merendas, é o combinado.
Durante o jantar em Melgaço, aparecem o Zé Tó e a Zézinha. Ficam logo interessados na tal surfada, claro! Compramos uma garrafinha de Alvarinho, para festejar não se sabe o quê, e vamos andando para Arbo. Quando lá chegamos, aparecem os espanhóis, já molhados e a rir. Já tinham descido... Afinal não era às duas e meia, mas às" doze e media" espanholas, ou seja, as nossas onze e meia!!! duplo mal entendido!!!!
Não faz mal, pensámos, já cá temos o Alvarinho...
Quem vai, quem não vai.... Há umas desistências honrosas, que dão um enorme jeito para levar os carros de volta a Arbo... Entramos na água em Melgaço, no fim de um estrada digna de uma prova de trial. Somos 5: Miguel, Zé Tó, Raquel, Filipe e eu.
Metade do tempo no escuro, pois a margem esquerda fazia sombra, outra metade a apanhar banhos de lua. O silêncio impera, parece-nos de início, mas os sentidos vão-se adaptando e aguçamos os ouvidos a tentar descobrir o próximo rápido, com certeza uma queda de metros e metros!! O Zé Tó que conhece o rio melhor, descreve várias vezes cada rápido, explica onde vamos entrar, o que fazer, onde sair. O problema é que mesmo com a Lua, nunca vemos o suficiente para nos tranquilizar! Mas ninguém se arrepende, pois o cenário é fantástico, o luar a iluminar as ondas e a espuma uma vista inesquecível.
Chegamos a Arbo num instantinho, onde já nos esperam os desistentes. Tal como à tarde, olhamos para a pedra que nos vai indicar se a onda está à nossa espera... e está! Nem saímos dos barcos, bebemos uns golinhos de Alvarinho para aquecer e entrar em maior harmonia com a região, pois as uvas das quais é espremido este néctar crescem nestas mesmas margens.
Continuamos a descer o rio, cujo caudal ia baixando rapidamente, mas agora vamos só três: eu, Zé Tó e Miguel.
Lá estava a onda, bem negra, quase toda na sombra e à nossa espera. Se de dia parecia brincalhona, agora a conversa era outra. Quem se quer virar no rolo e tentar esquimotar sem ver onde está a luz e sem que os companheiros vejam onde está?
Nem é preciso combinar... Só entra um na onda quando o anterior estiver são e salvo, virado para cima e bem à vista. De tarde era tudo ao molho, empurrões, puxadelas, gritos, surfadas a 2 e a 3. Agora parecíamos uns meninos de coro, alinhadinhos, tentando não desafiar "La Ola".
Entro devagarinho, junto do início do V e deixo-me levar até ao centro, como mandam os livros. Uma pagaiada rápida e estou a surfar. Já não sei descrever o que senti, mas na memória fica a água escura à sombra, completamente negra, a passar depressa por baixo do barco, a fazer cócegas no corpo todo. Atrás de mim, na 2ª onda, está o rolo, onde não quero ir parar, por me fazer lembrar das vezes que me virou. Vou à esquerda, à direita, lembro-me que podia tentar um 180, o nível até está bom, mas não me atrevo, mais tarde, com alguma confiança, já arrisco um back-surf, e fico cara-a-cara com o rolo que me espera quando fizer algum erro.
A surfada é mais curta que o normal, pois quero ser eu a controlar quando e como saio. Chego-me à esquerda, subo na onda, desço de repente e estou na contra-corrente. Mal me vê direito e a remar na sua direcção, entra o próximo, e assim sucessivamente. Não me lembro se alguém esquimotou, mas temos a certeza que largar a pagaia é perdê-la, pois ainda não vendem pagaias que brilham no escuro (talvez um dia venham nos pacotes de batatas-fritas com sabor a presunto!!)

Passado um bocado começamos a pensar em voltar. Já são umas cinco horas, daqui a nada faz-se dia...
Em Arbo estão à nossa espera, a palrar animadamente na relva, enquanto vão debicando umas batatas-fritas e bebendo umas SuperBock fresquinhas. A bem ou a mal, todas as histórias de riotêm de acabar assim!!!

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